Abrapp e outras entidades do setor dizem que proposta do Ministério da Fazenda pode trazer volatilidade indesejada e comprometer a estabilidade dos planos
Em nota conjunta, a Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão e de Beneficiários de Saúde de Autogestão (Anapar), Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) e Associação dos Fundos de Pensão e Patrocinadores do Setor Privado (Apep) criticaram a proposta do Ministério da Fazenda, noticiada pelo Valor, de modificar as regras vigentes para a marcação de ativos e passivos previdenciários a mercado. Para as associações, a proposta levanta diversas questões e preocupações que merecem uma análise aprofundada.
Thank you for reading this post, don't forget to subscribe!“A proposta do MF, ao introduzir a marcação a mercado para ativos e passivos previdenciários, pode trazer volatilidadeindesejada e comprometer a estabilidade dos planos. É possível alcançar os objetivos da proposta com ajustes pontuais na norma vigente, sem impor volatilidade adicional aos passivos e ativos e sem obrigar os planos a adotar uma gestão de risco zero. A decisão sobre a gestão de risco deve permanecer com os participantes, assistidos e patrocinadores dos planos, representados pela gestão da Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC), sob pena de gerar insegurança e descrédito dos trabalhadores participantes das entidades fechadas de previdência complementar”, informa a nota.
Ainda segundo as entidades, as regras atuais não surgiram “por acaso ou erro conceitual” e são resultado de anos de discussão e refinamento envolvendo profissionais da sociedade civil e do governo, abrangendo diversas disciplinas como atuária, economia, contabilidade e direito. “Essas normas foram estabelecidas após uma série de tentativas malsucedidas e arbitrárias de alteração das regras de solvência e precificação de ativos e passivos. Portanto, qualquer mudança significativa deve passar por um processo semelhante de rigor e abrangência”, informa a nota.
As entidades apontam que a proposta do Ministério da Fazenda fundamenta-se em uma comparação com os fundos públicos americanos, que, segundo o estudo, se tornaram mais propensos a riscos e apresentaram desempenho inferior a seus pares privados. A avaliação é que a realidade é distinta. “A regulamentação brasileira limita o incentivo à tomada de risco excessivo ao estabelecer um teto para a taxa atuarial, que é a média da Estrutura a Termo de Taxas de Juros (ETTJ) de cinco anos mais 0,4%. Essa limitação não é considerada nos estudos baseados em regras internacionais, gerando conclusões que não se aplicam ao contexto brasileiro”, explica a nota.
Além disse, conforme as entidades, as normas vigentes para a formação da taxa de desconto do passivo incorporam vários conceitos, incluindo a rentabilidade projetada da carteira dentro de um intervalo legal. Segundo nota, a proposta do Ministério da Fazenda parece não compreender os incentivos gerados pelas regras atuais, que devem ser avaliadas em conjunto com a precificação de ativos e passivos, regras de solvência e ajuste de precificação de títulos públicos federais. “Contrariamente ao que sugere o estudo do MF, as regras vigentes não “escamoteiam” a solvência, mas sim criam incentivos corretos e anticíclicos. A compra de títulos em momentos de crise é incentivada, permitindo aos fundos de pensão atuarem como agentes estabilizadores do mercado”, destacam ainda.
As entidades ressaltam também que o dogma da marcação a mercado, embora legítimo em certos contextos, pode ser inadequado para ativos e passivos previdenciários de longo prazo. O entendimento é que marcação a mercado é adequada para evitar transferências de riqueza entre cotistas em fundos abertos com liquidez, mas sua aplicação a planos de benefício definido (BD) pode agravar crises e distorcer preços de mercado. A volatilidade introduzida pela MtM pode comprometer a viabilidade e estabilidade dos planos de previdência, dizem.
Além disso, o uso de taxas de mercado pode gerar volatilidade excessiva nos níveis de solvência e contribuição dos planos previdenciários e produzir efeitos pró-cíclicos, incentivando movimentos de curto prazo nas carteiras de investimentos e agravando crises econômicas. “Vários países que introduziram a marcação a mercado em ativos e passivos previdenciários tiveram uma modificação de perfil da carteira de investimentos, que se tornou mais curtoprazista, interferindo, inclusive, na dinâmica e nas taxas do próprio mercado, gerando um efeito prócíclico, agravando a crise que pretendia reduzir”, destaca ainda a ainda.
Conforme as entidades, muitos países utilizam técnicas de suavização (“smoothing”) para mitigar os efeitos da volatilidade dos mercados nos níveis de contribuição e que a atual regulação brasileira já incorpora elementos que incentivam a alocação em ativos correlacionados ao passivo, como os NTN-Bs, e mantém menor volatilidade no índice de solvência.
O Valor noticiou que o Ministério da Fazenda quer que os fundos de pensão considerem a marcação a mercado na contabilização não só dos ativos como também dos passivos. Segundo o secretário de reformas econômicas do ministério, Marcos Pinto, a proposta de mudança está sendo negociada no governo, citando como exemplo a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). A iniciativa teria como objetivo diminuir o descasamento entre ativos e passivos e, ao mesmo tempo, estimular o uso de novas modalidades de investimentos de longo prazo.
O secretário disse que a equipe econômica está disposta a atender pleitos que tratam de mudanças nos limites de investimentos dos fundos de pensão. Porém, essa iniciativa precisa ser acompanhada por mudanças na contabilização de ativos e passivos para que não seja “inócua”.
Na ocasião, a Previc também divulgou nota informando que a Diretoria Colegiada do órgão apoia as iniciativas de fomentar o investimento em infraestrutura por parte das EFPC, inclusive por meio das debêntures de infraestrutura recentemente. Segundo nota, para o diretor-superintendente, Ricardo Pena, seria possível discutir no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) melhorias na precificação dos ativos financeiros e do passivo previdenciários, como indicado no Relatório da Transição Governamental de 2022, “desde que resguardados os aspectos da regulação prudencial, ampliação da diversificação do portfólio dos planos previdenciários e com reforço na supervisão da autarquia sobre as EFPC”.
“Importante salientar que não existe na legislação atual (LC 109/2001) qualquer vinculação entre a aprovação pelo CMN das diretrizes de investimentos dos planos previdenciários e a aprovação pelo CNPC das regras de solvência e parâmetros técnicos atuariais utilizados pelas EFPC”, informou nota da Previc.
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