Previc: Iniciativa do governo de aproximar os sistemas de previdência aberta e fechada não est á paralisada

José Roberto Ferreira Savóia, novo titular da Previc, é favorável à ampliação dos limites para investimento no exterior mas contrário mudar o prazo de 2030 que as EFPCs zerem suas posições em imóveis físicos

Cerca de vinte anos depois de ter comandado por um ano e meio a antiga Secretaria de Previdência Complementar (SPC), que precedeu a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) na regulação dos fundos de pensão, José Roberto Ferreira Savóia volta à atuar no sistema de fundos de pensão dessa vez no comando da Previc. Ele assumiu o cargo de superintendente em 7 de julho último, no lugar de Lúcio Capelletto, que foi designado para o posto de secretário executivo de previdência do Ministério do Trabalho e Previdência.

Muita coisa mudou no sistema nesses vinte anos em que ele esteve longe de Brasília, envolvido em São Paulo com atividades acadêmicas na Universidade de São Paulo ou dirigindo o Iprem, o instituto de previdência municipal de São Paulo, entre 2010 e início de 2013. Talvez a mais importante delas, segundo ele, tenha sido o surgimento das entidades de previdência complementar dos funcionários públicos, cujos principais nomes são hoje a Funpresp-Exe, dos servidores federais dos poderes executivo e legislativo, a Funpresp-Jud, dos servidores federais dos poderes executivo, e a Prevcom, que reúne além dos servidores públicos do Estado de São Paulo também servidores de outros quatro estados e de 15 municípios.

Savóia avalia que a aprovação em 2019 da Lei Complementar 103, que instituiu a Reforma da Previdência, cria uma nova etapa no desenvolvimento do sistema de previdência complementar. “Essa etapa vai representar um crescimento ainda maior do que as anteriores, por incluir além dos servidores públicos federais também os de estados e municípios”, diz.

Segundo ele, cerca de 1.750 entes federativos se enquadram às exigências da Lei Complementar 103, que obriga os entes que possuem Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) e servidores públicos com salários acima do teto do INSS a constituírem Regimes de Previdência Complementar (RPC). Desses 1.750, apenas uns 250 já criaram esses regimes e aderiram a algum gestor previdenciário, restando cerca de 1.500 por fazê-lo.

A adesão, segundo a LC 103, pode ser feita tanto à entidades de previdência fechada quanto abertas, mas na prática é direcionada apenas às fechadas, uma vez que a regulamentação para que as abertas possam receber essas adesões não aconteceu. “A abertura das inscrições dos RPCs às entidades abertas é um assunto que não está paralisado no governo, é um tema que está em pauta”, afirma Savóia.

Ele não dá detalhes sobre as iniciativas do governo nessa direção, mas diz que “obviamente, tem uma agenda do Congresso que está sendo colocada. Há a intenção do governo de avançar nisso”. Isso implicará, segundo ele, tanto na resolução do problema da adesão dos RPCs às entidades abertas como também em outros temas no sentido de fortalecer a previdência complementar, no sentido de torná-la “mais ampla do que é hoje”. Ele cita que o regime precisa ser capaz de “cobrir também os trabalhadores informais, além de trabalhadores que têm a sua própria empresa”.

Em ambos os casos, o caminho é “uma confluência maior entre entidades abertas e fechadas”, cujo encaminhamento não passa pela Previc mas por outras instâncias do governo, incluindo a Secretaria de Previdência Complementar, além de patrocinadoras e participantes, explica. “É intenção do governo avançar nisso”, afirma. “É uma agenda importante porque cria mais vasos comunicantes entre os dois sistemas”.

De acordo com ele, esses vasos comunicantes são fundamentais de serem definidos. Por exemplo, na questão da retirada de patrocínio, onde o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) aprovou em março último a Resolução 53, definindo os casos em que as patrocinadoras podem invocar esse recurso, os participantes não contam com um mecanismo garantindo seu direito à a migração para outra entidade no caso de insatisfação com o seu plano. “Um pedido de retirada de patrocínio não agrada ninguém, ninguém gosta disso, mas é um direito da patrocinadora”, afirma. “Da mesma forma queremos avançar com mecanismos que permitam ao participante, quando não está satisfeito com seu plano, o direito de migrar para outro”, diz.

Ele diz que a Resolução 53 não tem o objetivo de facilitar pedidos de retirada, mas de “aperfeiçoar o ordenamento jurídico desse instrumento, apenas isso”. A nova resolução foi recebida com desconfiança pelos dirigentes das entidades à época em que foi aprovada pelo CNPC, apesar de a Previc ter explicado que ela não criava nenhum mecanismo novo, apenas consolidava as regras que já existem e tornava mais claro algumas situações não especificadas nas regras antigas, como a da falência de uma empresa, por exemplo. A nova resolução deve entrar em vigência a partir de outubro.

Para Savóia, o sistema deve ser capaz de negociar e achar soluções aceitáveis em temas nos quais patrocinadoras e participantes tenham interesse, como é o caso das mudanças de índices de reajustes de benefícios. Estabelecido na Resolução 40 do CNPC, a perspectiva começou a ser usada pelas patrocinadoras para fugir de um indexador, o IGPM, completamente descolado da inflação do IPCA. Segundo o superintendente da Previc, manter um índice de reajuste de benefícios completamente descolado da realidade é prejudicial ao plano, então patrocinadoras e participantes devem negociar em busca de uma solução. “As patrocinadoras devem oferecer um outro índice e os participantes devem entender que se levarem a situação à extremo a patrocinadora pode pedir a retirada do patrocínio”, diz. “Não pode ter um lado que não aceita nenhuma mudança e outro lado que diz ‘eu não quero mais brincar’. Não pode ser o tudo ou nada”.

Em relação à mudanças nos limites de investimentos da Resolução 4.994, antiga 4.661, ele diz que é favorável à uma evolução. Sua opinião é de que o aumento do limite de investimento no exterior, de 10% para 20%, é factível. “Com a globalização dos investimentos, não dá para restringir o acesso das EFPCs, principalmente das grandes, a apenas 10% de investimentos no exterior”, afirma. “Isso pode comprometer a sua capacidade de gerar resultados”.

Outro tema que tem sido abordado com frequência pelos dirigentes dos fundos de pensão é a exiguidade do prazo dado às entidades para se desfazerem de seus imóveis físicos, que deve acontecer até o ano de 2030. Segundo alguns dirigentes de EFPCs, é um prazo muito curto. Outros, ainda, consideram que é um erro obrigar as entidades a se desfazerem desses ativos, que são geradores de renda e importantes no portfólio de investimentos de fundos de pensão de diferentes partes do mundo.

Segundo Savóia, o objetivo da medida não é afastar os institucionais dos produtos imobiliários, mas forçar para que isso seja feito através de fundos imobiliários, que são mais transparentes e possuem mais liquidez. Atualmente, os fundos imobiliários podem acessar tanto o mercado de tijolos quanto de papéis de empreendimentos imobiliários através de suas verticais específicas para esses objetivos.

Em relação ao argumento de que, com o prazo limite de 2030 se aproximando, as entidades podem se ver forçadas a vender em condições desvantajosas, Savóia diz que “temos sete anos até 2030. Considerado que há alguma coisa como R$ 35 bilhões em imóveis físicos, isso representaria a venda de cerca de R$ 5 bilhões por ano, em média, para chegar zerado ao final”.

Segundo ele “não acredito que as entidades vão deixar para vender no último ano”. Então não faz sentido discutir nesse momento, sete anos antes, a possibilidade dos fundos de pensão serem levados a “corner” pelo mercado no ano de 2030. “Se acontecer, o regulador da época vai ver como resolver.

Com ironia, diz que uma das vantagens de já ter passado uma primeira vez pelo cargo é que “já conheço a choradeira. É a mesma de sempre”. Segundo ele, em sua primeira passagem pelo cargo, na antiga SPC ainda, foi estabelecido que seria implementada a custódia dos investimentos em empresas externas. “Foi aquela grita, muita gente dizendo que não dava, que aquilo não era bom, e o que aconteceu? A custódia foi implementada e não aconteceu nada”, afirma. “Então, agora não adianta vir com velhas desculpas, essas eu conheço todas. Pelo menos sejam originais”.

Otimista com as perspectivas da previdência complementar, ele diz que as entidades conseguiram montar times de gente especializada nos últimos anos. Nas suas palavras, é “gente competente para gerenciar ativos mais complexos”. Isso inclui aproveitar as oportunidades que se abriram com o aumento da Selic desde meados do ano passado, que abriu a curva dos títulos públicos até oferecerem taxas que superam o atuarial das fundações. Segundo Savóia, “é uma janela de oportunidade a ser aproveitada pelas entidades. Devem comprar e colocar nas carteiras a vencimento”.

Da mesma, forma, esse time de profissionais capazes de gerenciar ativos mais complexos, sabe que a taxa de juros alta um dia acaba. Então, tem que estar preparada para buscar oportunidades em outras classes de ativos, de mais risco. “Mas não estou preocupado com isso, acho que o sistema está ciente disso, e preparado para esse desafio”.

https://www.investidorinstitucional.com.br/sessoes/investidores/fundosdepensao/38898-a-volta-vinte-anos-depois-segundo-o-novo-superintendente-da-previc-iniciativa-do-governo-de-aproximar-os-sistemas-de-previdencia-aberta-e-fechada-nao-esta-paralizada.html