Empresa mira internacionalização e investe US$ 675 milhões em negócios nos Estados Unidos
Fernando Musa (Foto: Revista ÉPOCA)
Depois de três anos seguidos de recessão, o setor de produtos químicos e petroquímicos vislumbra cenário de recuperação econômica em 2018. Tanto que a Braskem, líder na produção de resinas plásticas nas Américas, trabalha com a perspectiva de crescimento do PIB entre 2,5% e 3% este ano. Os primeiros sinais de reação foram observados no segundo semestre do ano passado e se mantêm, com mais vigor, neste início de ano, diz Fernando Musa, presidente da Braskem, a sétima colocada no ranking das 1000 Mais, do Valor. “Há sinais claros de retomada”, assegura. Segundo ele, praticamente todos os segmentos industriais, consumidores direta ou indiretamente de produtos petroquímicos, já apresentam recuperação. Exceção é o setor da construção civil, ainda tímido.
Em relação ao processo de reestruturação acionária da empresa (a Petrobras, sócia da Braskem, já anunciou intenção de se desfazer de ativos no setor petroquímico), Musa acredita que “o impacto disso para Braskem, na prática, é mínimo”. “Essa é uma discussão que se dá a nível do acionista”, diz ele, garantindo que a empresa segue sua trajetória e plano estratégico de agregar valor ao acionista. “Mesmo depois do anúncio da Petrobras, a Braskem aprovou investimentos de US$ 675 milhões em nova planta nos EUA”, argumenta ele.
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADADE
Envolvida na Operação Lava-Jato, a Braskem, controlada pela Odebrechet e Petrobras, fechou acordo global de leniência em dezembro de 2016 com pagamento de multas e indenizações de R$ 3,1 bilhões (US$ 960 milhões). O acordo foi feito em conjunto com autoridades brasileiras, americanas e suíças. Segundo Musa, a empresa já pagou “pouquinho mais de 50% da penalidade financeira”. Para ele, a Braskem “já virou essa página”.
Quais as perspectivas da economia brasileira e mundial este ano?
Já temos um planejamento para 2018, desde ano passado. Dadas as características da Braskem, hoje uma empresa global, ela olha a economia brasileira e mundial como um todo e, em mais em detalhes, as regiões e países onde atua: Brasil, México, Estados Unidos e Alemanha (Comunidade Europeia).
No cenário global, a boa notícia é o crescimento saudável do hemisfério Ocidental a da China, que é o grande vetor de crescimento para o mundo como um todo. Com recentes mudanças anunciadas pelo partido chinês, a China vai na direção positiva e se transformará, cada vez mais, em destino econômico poderoso. Não temos unidade industrial na China, mas, dependendo do produto químico ou petroquímico, 30% a 40% da demanda mundial está dentro da China. O país tem muito fluxo de produto e precificação de mercado é feita pelo fluxo internacional. China tem papel extremamente importante, sua influência para nosso setor é enorme. Se China tiver um resfriado, nossa indústria sofre bastante. Em alguns produtos, a China é exportadora. Em outros, é importadora. Em nossos principais produtos, eles são exportadores.
Os sinais do mundo são positivos, e se somam à expectativa, depois de três anos difíceis, de retomada de crescimento no Brasil, que, claramente, já se pôde observar no segundo semestre do ano passado. Nossa indústria petroquímica é precursora; tendemos a entrar em recessão mais rápido do que a economia, e sair dela também mais rápido. O segundo semestre deu claros sinais de que a economia está melhorando e nossa participação na economia brasileira é bastante abrangente. Praticamente todo o segmento industrial, direta ou indiretamente, utiliza nossos produtos e, tirando construção civil, todos os segmentos tiveram resultado bastante positivo no ano passado, e surpreendentemente positivo no segundo semestre, dando boas perspectivas para 2018.O exemplo mais marcante é a indústria automobilística. Claramente, seu crescimento tem sustentabilidade. E este é sinal positivo para a economia.
>> Petrobras: tolerância zero com desvio ético
Mas as incertezas no cenário político, podem atrapalhar?
Com a eleição acaba se criando algum conjunto de incerteza, especialmente em relação às reformas, que são críticas para o país. Mas, na minha visão, o cenário político de 2018 vai acabar tendo influência menor. Ele vai ser importante para a construção de futuro. Se avançar nas reformas, torna o futuro mais auspicioso; se não avançar, vai empurrando mais para frente os desafios de reestruturação da sociedade brasileira. Se conseguir avançar o ritmo das reformas, teremos menos volatilidade. Mas todo mundo já está precificando isso (o ambiente político), já está nas expectativas.
De que forma a reforma trabalhista pode contribuir para o desempenho do emprego no país e na empresa, que contabiliza cerca de oito mil empregados nos países onde atua?
A reforma trabalhista cria algumas oportunidades importantes para Braskem, que estamos ainda avaliando, especialmente na questão de jornada de trabalho, visto que temos plantas industriais em processo contínuo, operando 24 horas por dia, em turnos e estrutura de turnos. A flexibilidade que a reforma cria permite fazer alguns ajustes e mudanças que podem ajudar para compatibilizar com indústria globalmente. Temos turnos mais longos fora do Brasil, no México, nos Estados Unidos e na Europa, com escalas de descanso diferentes, que permitem ganho de produtividade. A cada troca de turno gera perda de produtividade. Quando o turno é mais longo, diminui frequências de trocas. Este é apenas um exemplo de como a reforma vai ajudar.
A reforma trabalhista é positiva e contribui. A Braskem é uma empresa muito grande, com mais capital intensivo. Nossa questão é mais de infraestrutura e tributária. A reforma da Previdência também é importante para o país e para a economia, para alavancar cadeias de produção.
A Braskem já consegue dimensionar efeitos práticos de retomada da economia brasileira?
Há sinais claros de retomada. Os bons resultados do segundo semestre de 2017 estão indo para 2018. Estamos entrando no ano em ritmo bom.
Quais são suas projeções para o PIB este ano?
Projetamos crescimento da economia entre 2,5% a 3% ao ano, se não houver nenhuma surpresa mega no campo econômico e político. Se tiver algo inesperado, talvez caia mais para 2,5%. Mas nossa expectativa é essa, entre 2,5% e 3% para este ano.
A alta taxa de desemprego permanecerá em 2018?
É um processo natural, à medida que economia vai se alavancando, e com a reforma trabalhista, tem impacto positivo sobre emprego formal, demanda, consumo e novos investimentos. O desemprego hoje está em patamar muito alto no Brasil e, para ter mudança significativa, serão necessários vários trimestres de resultado positivos de crescimento econômico, de investimento. Esse é o ciclo. Tem muita gente com planta rodando com baixa capacidade, com meio turno, com um só turno; tem setor que precisa de novos investimentos, mas vem segurando e empurrando para frente. Talvez agora algum setor coloque mais capital na construção de novas plantas industriais, em reformas. As perspectivas estão boas, especialmente se comparar com os últimos três anos. O único alerta, que é setor relevante para o negócio da Braskem, é o setor da construção civil, que, de todos os setores, ainda é o mais tímido. Ele começa a dar primeiras indicações de que as coisas vão melhorar, mas, para nós, ainda foi o único setor, no ano passado, que teve queda relevante em relação à 2016; os outros todos tiveram aumento. Com a sustentabilidade dessa recuperação da economia, o pessoal aumenta confiança, alavanca investimento e emprego.
>> O Brasil vai retomar sua presença no mundo?
A Braskem planeja novos investimentos este ano?
Nossos investimentos no México atingiram US$ 5 bilhões em nova planta industrial (de polietileno). Ano passado, foi o primeiro ano completo de operação dessa unidade. Estamos muito satisfeitos com o impacto do desempenho industrial e presença comercial no México e nos Estados Unidos. Anunciamos, no ano passado, nova planta de polipropileno nos Estados Unidos, com investimentos de cerca de US$ 675 milhões; já está em construção, com partida esperada em 2020.
A Braskem vai investir, em 2018, quantidade expressiva de dinheiro na manutenção das plantas industriais e na melhoria de projetos de produtividade e qualidade. Em termos de capacidade de produção, o principal projeto hoje é a nova planta dos Estados Unidos. É a sexta planta desse produto no país norte-americano. Estamos avaliando outros projetos, mas nada que tenha sido levado ao conselho (de administração). Nosso parque industrial no Brasil é o mais expressivo. Nossa presença fora do Brasil ou é muito nova, como no México, ou as plantas são mais simples, proporcionalmente com menos investimentos correntes. O grosso dos investimentos é feito no Brasil. A Braskem investe em média cerca de US$ 500 milhões por ano na manutenção e melhoria de suas plantas industriais (investimentos correntes). Grande maioria desse dinheiro é no Brasil. É um número médio/ano e muito consistente. Será ao redor desse número, para este ano.
Cerca de 50% da receita da Braskem acontece fora do Brasil, entre o que é produzido no exterior e o que é exportado a partir do Brasil. Mais de 50% do faturamento está fora do Brasil. Cerca de 30% a 32% do Ebitda (lucro antes do pagamento de juros, impostos, depreciações e amortizações) está fora do Brasil. Esta é a média dos últimos doze meses, em final de setembro do ano passado. Lembrando que a planta do México, no último trimestre de 2016, ainda estava em processo de partida. Esse número deve crescer um pouco nos próximos anos. À medida que o México vai entrando em patamar de utilização mais alto e, com a planta dos Estados Unidos, a presença externa vai agregando participação no Ebitda. A tendência é ela crescer para cerca de 50%, tendendo, no médio prazo, a se aproximar mais do nível de participação que tem a receita.
Neste cenário, qual é o comportamento do câmbio e da taxa de juro no Brasil?
O câmbio este ano vai ter certa volatilidade. Vimos isso em janeiro. Mas acho que teremos uma faixa entre 3,20 reais e 3,40 reais. O câmbio vai ser mais nervoso em relação ao ritmo político. Mas a expectativa é de volatilidade ao redor de um patamar estável de apreciação do câmbio em comparação com o ano passado.
Em relação a juros, a combinação de crescimento econômico no Brasil, cenário mundial, inflação baixa, dentro da meta fixada pelo Banco Central, fará com que o juro fique em um digito; mas ainda alto em relação a demais países do mundo. Porém, mais razoável.
>> A próxima grande reforma a fazer, se quisermos gerar empregos
Para uma indústria petroquímica como a Braskem, o comportamento dos preços do petróleo é variável fundamental. Quais as previsões para este ano?
O mais crítico para nós é volatilidade, que cria enorme incerteza em nosso cliente. Se houver muita volatilidade, tem impactos. Por exemplo, se o preço fica dois anos em 40 dólares, vai para 60, depois 70, e volta para 40, variando assim, em ciclos muito curtos, cria muita incerteza na cadeia da Braskem. Mas não é o que está acontecendo. Está surpreendendo a capacidade da Opep (Organização dos Países Produtores de Petróleo) de fazer os cortes de produção; e parte da indústria americana ainda não se aproveitou disso; tem um “delay” e aí, mais para frente, vamos ver o que os americanos vão fazer com o petróleo de xisto. Os americanos estão ampliando suas perfurações, e em três ou quaro meses devem gerar maior produção. Vamos ver o que acontece.
Com capital intensivo e alta tecnologia, a Braskem prevê ampliar investimentos em pesquisa e desenvolvimento?
Inovação é muito importante. O fato de a Braskem atender praticamente todos os segmentos da economia faz com que a inovação venha com diversificação de produtos e com investimentos também em infraestrutura para inovação. Temos centros de pesquisa no Brasil, nos Estados Unidos, no México e na Alemanha, com cerca de 300 pessoas trabalhando na área de conhecimento, a maioria mestres e doutores em variados campos da ciência relevantes para nós. Vamos seguir com esses investimentos tanto no portfólio dos produtos químicos e petroquímicos mais tradicionais, como na química renovável, que é prioridade. O laboratório de Campinas é 100% dedicado à biotecnologia, focado em matéria-prima renovável. Hoje somos o maior produtor de biopolímeros do mundo de polietileno a partir do etanol de cana de açúcar. O chamado polietileno verde, que vende no mundo inteiro. Esta planta hoje está o Rio Grande do Sul. E temos vários outros projetos em biotecnologia. O laboratório de Campinas tem cerca de 40 doutores, PHD em biotecnologia com vários projetos importantes. Os investimentos da Braskem em P&D (pesquisa e desenvolvimento) variam entre R$ 180 milhões e R$ 200 milhões por ano.
Os desafios de curto prazo são Venezuela, que é questão estrutural, e Nigéria.
A Petrobras, em processo de venda ativos, já indicou que pretende sair do capital da Braskem. Qual será o impacto disso sobre a empresa?
Essa questão acontece no nível do acionista. A Petrobras anunciou em 2016 que ia desinvestir em quatro segmentos, inclusive petroquímica. Em agosto do ano passado, anunciou ao mercado que iniciava diálogo com a Odebrecht para ajustar o acordo de acionistas. Há dez dias fez novo anúncio dizendo que o diálogo estava evoluindo na direção de uma reestruturação de governança, inclusive avaliando a unificação de classe de ações. Então, o que eu posso dizer, primeiro, é decisão do acionista. Eles estão avançando conforme mostram esses comunicados. Não participamos diretamente, mas está claro que o processo está andando.
O impacto disso para Braskem, na prática, é mínimo. Nada mais é do que o acionista tomar decisão de potencialmente vender um ativo, que tem tido resultados muito bons, e tem ainda muito potencial de valorização. O que tenho dito para as equipes da Braskem é que não muda nosso plano estratégico, que tem tido muito sucesso; não muda a forma como operamos, que tem tido também muito êxito. No ano passado, batemos vários recordes de produção. Os resultados foram bastante bons; temos oportunidades de investimento, como a planta dos Estados Unidos mostra. E vamos seguir a nossa jornada. É óbvio que o valor da ação no mercado acionário, com essa movimentação, acaba gerando impactos e expectativas. Mas, em relação a investimentos, durante esses dois anos, e desde que Petrobras anunciou seu desejo, em meio a isso, aprovamos investimentos da planta dos Estados Unidos. A Braskem tem sua governança própria, tem seu conselho de administração, sua estratégia de valorização do negócio.
A questão é como a Petrobras vai fazer essa saída; se de uma vez só, se via oferta. Tem saído matéria em jornal que ela vai fazer venda no mercado. Não cabe a mim especular; é uma decisão da Petrobras. Diferentes formas de sair podem ter diferentes implicações; vamos ver as implicações, temos nossas estratégias de criar valor, nossa governança. Se houver novo acionista, empresa ou fundo, ele estará vendo o valor do que estamos fazendo. Não tenho expectativa de mudança radical de rumo para a empresa.
Com acordo de leniência firmado, a Braskem se sente recuperada do processo da Operação Lava-Jato?
Fechamos acordo global com as autoridades em 2016, já pagamos um pouquinho mais de 50% da penalidade financeira, nosso programa de conformidade está bem adiantado, com sucesso. Este é um tema que na Braskem, diria, já viramos a página. Braskem tem um conselho, os acionistas estão representados na Braskem através de conselho eleito pela assembleia de acionistas, a maioria membros independentes, não têm ligação com Petrobras ou com Odebrecht, as decisões de Braskem são aprovadas em conselho.
Superada essa fase, quais são as estratégias da empresa?
A estratégia global da Braskem é foco em produtividade e competitividade, com investimentos constantes, da ordem de US$ 500 milhões por ano, em média. Tem outro pilar estratégico na linha de diversificação de matéria-prima para aproveitar e enfrentar preço e volatilidade das matérias-primas, que são diferentes, especialmente nas matérias primas que vêm do petróleo e do gás natural; temos vários esforços de diversificação de matéria-prima e de mercados.
O Brasil, que é nossa origem, passou por três anos de recessão e, mesmo assim, foram três anos seguidos de recordes operacionais e financeiros para a companhia, graças aos investimentos em produtividade, mas também, e muito, graças à diversificação geográfica, que fez com que navegássemos nos desafios da economia brasileira com muito bons resultados.
No mundo das resinas, nossas vendas externas são muito concentradas nas Américas e na Europa; no mundo de produtos químicos, temos exportações para o sudeste asiático, Japão e Coréia do Sul. Para China, as vendas são poucas e representam principalmente um esforço de conhecimento do mercado, em função de sua importância. Não temos planos de aumento importante de presença comercial ou de planta industrial na China. Temos escritório em Cingapura que atua na Ásia.