Expectativa de baixos retornos e volatilidade nos mercados na próxima década tem levado dirigentes a rever portfólios para garantir rentabilidade
Ativos sob gestão e liquidez das grandes fundações (em pdf)
Fundos de pensão dos Estados Unidos estão começando a promover alterações nas suas carteiras de investimento para enfrentar um período de baixos retornos no mercado financeiro, que está previsto para a próxima década, segundo reportagem da revista americana Pension&Investment.
As projeções pouco animadoras para as rentabilidades possíveis de serem obtidas no mercado nos próximos anos tem partido de inúmeros especialistas considerados gurus da área de investimento, como é o caso de um dos fundadores e chefe estrategista de investimentos da Grantham, Mayo, Van Otterllo & Co LLC, Jeremy Grantham. No início de janeiro de 2018 o profissional apontou que as chances de uma bolha no mercado nos próximos seis meses a dois anos são maiores do que 50%, acrescentando que, se isso de fato vier a ocorrer, a probabilidade de uma queda nos preços dos ativos superior aos 50% são “muito, muito altas, acima de 90%”.
Em termos matemáticos, o desafio do retorno a ser alcançado pelos fundos de pensão públicos americanos fica bastante claro. A taxa média de retorno dos cem maiores planos das entidades de previdência complementar dos Estados Unidos no ano fiscal de 2016 (que são os dados mais recentes disponíveis) ficou em 7,5%. No entanto, se considerada uma composição do retorno médio anualizado dos últimos dez anos, o retorno obtido pelos planos das grandes fundações públicas americanas cai para 5,5%.
Diante deste cenário previsto, os dirigentes responsáveis pelos fundos de pensão e suas equipes estão, em sua grande maioria, mantendo as estratégias de investimentos já existentes nos últimos anos, mas com alguns ajustes em suas carteiras na tentativa de potencializar os retornos e aprimorar a eficiência dos portfólios.
“Não estamos observando um pânico generalizado, mas temos ouvido uma série de preocupações de fundos de pensão públicos que são nossos clientes”, afirmou o vice-presidente executivo e responsável pela área de pesquisas de mercados da consultoria de investimento Callan LLC, Jay Kloepfer.
Insuficiência – A maior parte dos grandes fundos de pensão públicos dos Estados Unidos enfrentam problemas de liquidez. Em média, as entidades tem somente 68% de recursos disponíveis para fazer frente aos pagamentos previstos aos seus participantes para as próximas décadas.
Caso a próxima década venha a se confirmar como uma época de retornos insuficientes para que as fundações possam cumprir com suas obrigações atuariais, isso pode até mesmo colocar em risco a capacidade dessas entidades de atingir o nível de liquidez necessário para sua sustentabilidade no longo prazo.
Os fundos de pensão corporativos, por outro lado, são fundamentais para que se mantenha a adequada liquidez dos planos BD para que estes sigam em linha com a lei de segurança e renda de aposentadoria dos empregados, independentemente dos retornos do mercado.
Dadas as previsões de rentabilidade possível com os ativos financeiros do mercado à frente, diversos consultores de investimento têm enfatizado que é pequena a probabilidade de os fundos de pensão conseguirem assumir taxas de retorno esperadas acima de 7% para um período de dez anos. Contudo, quando o período considerado é maior, como 20 ou 30 anos, as chances de as entidades obterem tal taxa de retorno aumenta de maneira significativa, sendo que o horizonte de longo prazo para os investimentos combina bem com os passivos das fundações.
Os consultores de investimento da NEPC LLC, explicou Phillip Nelson, sócio e diretor de asset allocation da casa, tem destacado aos seus clientes fundos de pensão públicos que “a principal prioridade deles deve ser melhorar o status de liquidez de seus planos” ao longo da próxima década. “Se as entidades puderem ao menos manter seu atual nível durante os próximos dez anos, aumentam as chances de conseguirem uma melhoria desse quesito nos próximos vinte anos”, pontuou Nelson.
O ponto a ser monitorado de perto é se elas realmente terão capacidade e condições para ter sucesso na manutenção de seus patamares de liquidez até 2028, principalmente no caso das fundações que já registram no momento fluxos de recursos baixos ou até mesmo negativos, e que, portanto, estão mais vulneráveis aos movimentos de queda do mercado.
“Os baixos retornos esperados são um dos dois maiores desafios que os fundos de pensão dos Estados Unidos terão de enfrentar nos próximos anos. O outro desafio é a possibilidade de que nossa economia enfrente um novo período de recessão, que poderia causar uma redução média ao redor de 15% nos níveis de financiamento das fundações”, disse o vice-diretor de investimentos do sistema de aposentadoria dos professores do Estado do Texas, Jase Auby, que faz a gestão de aproximadamente US$ 146 bilhões.
Tendo em vista a expectativa de retornos insuficientes, Kloepfer, da consultoria Callan, apontou três alternativas para que os dirigentes dos fundos de pensão públicos gerenciem suas carteiras na próxima década da melhor maneira possível. Entre as opções sugeridas pelo especialista às fundações estão que elas simplesmente aceitem o ambiente global de retornos menores e sigam com a atual alocação já existente de seus portfólios; adotem uma estratégia mais tática e mantenham um volume elevado de recursos em caixa no aguardo de melhores oportunidades, ou adotem instrumentos financeiros de proteção, em ambas as situações com uma necessária redução da exposição à renda variável; ou ainda explorar todas as possibilidades que se apresentem no mercado de capitais em busca de fontes de retorno que ainda não foram detectadas, o que pode incluir estratégias com ativos privados, tais como private equity, real estate, infraestrutura, ativos reais e de crédito.
Criatividade – Os diretores de investimento dos fundos de pensão têm encontrado maneiras criativas de aumentar os retornos de suas carteiras, como reduzir o número de gestores terceirizados em uma mesma classe de ativo, e criar parcerias estratégicas com seus pares para alocar um montante maior de recursos com determinada asset que gere uma redução dos custos, falou o sócio e chefe da área responsável pelo atendimento aos planos de benefícios dos fundos de pensão públicos da consultoria de investimento Aon Hewitt, Michael Comstock.
Negociações agressivas das entidades previdenciárias junto aos gestores em busca de redução das taxas de administração também tem se mostrado uma estratégia assertiva, disse Comstock. Segundo o especialista, há uma quantidade cada vez maior de gestores de recursos que têm reduzido as taxas cobradas ou que estão criando novos produtos nos quais só recebem taxas de performance quando excedem o retorno médio do mercado.
O Calpers (California Public Employees’ Retirement System), fundo de pensão dos empregados públicos da Califórnia com US$ 361,6 bilhões em ativos sob gestão, tem sido apontado por especialistas como um exemplo de fundação que tem conseguido aumentar as chances de cumprir com suas taxas de retorno projetadas e ao mesmo tempo proteger e aprimorar seus níveis de liquidez.
Em dezembro os dirigentes do Calpers aprovaram uma nova estratégia de alocação de recursos para os próximos três anos a partir de 1° de julho, que prevê alterações na posição atual da entidade no mercado, mas sem que ocorra uma revisão completa de sua abordagem de investimento.
A exposição alvo em ações globais da fundação californiana aumentou de 46% para 50%; a renda fixa teve sua fatia elevada para 28% com a eliminação de uma carteira em separado de ativos indexados à inflação que representava 9% do total da carteira e com o aumento de 8 pontos percentuais na capacidade de recursos a serem absorvidas pela classe; o espaço para private equity permaneceu em 8%, enquanto os ativos reais seguiram com uma fatia de 13%; e a parte líquida do portfólio foi reduzida de 4% para 1%.
De acordo com a equipe de investimentos do Calpers, a nova estratégia de alocação deve ser capaz de entregar a taxa de retorno assumida de 7% sem a necessidade de modificações na meta atuarial ou nas contribuições dos empregados ou patrocinadores. O fundo da Califórnia estima que seu retorno anualizado nos próximos dez anos seja de 6,1%, percentual que deve aumentar para 8,3% no período de 11 a 60 anos à frente. O nível de financiamento da liquidez em junho de 2017 era de 68%.
Para manter a exposição alvo de 8% em private equity o Calpers decidiu aumentar seus co-investimentos e suas operações no mercado secundário. Os dirigentes da entidade aprovaram um plano de mitigação de riscos, que entrará em vigor em 1° de julho de 2020, para reduzir a vulnerabilidade a uma eventual desaceleração do mercado.