Juiz federal havia bloqueado bens de ex-funcionários da empresa após MPF apontar irregularidades em aporte do fundo de pensão da Caixa na Odebrecht Ambiental
PREVENÇÃO
Policial federal em ação na Operação Greenfield. Por prevenção, o juiz Vallisney de Oliveira mandou bloquear R$ 141 milhões (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Sete meses tinham se passado desde a homologação de sua delação premiada pelo Supremo Tribunal Federal, em janeiro, quando o ex-presidente da Odebrecht Ambiental Fernando Reis tentou fazer uma operação bancária e não conseguiu. Ressabiado, ele avisou o departamento jurídico. A empresa não sabia de nada, mas as contas de Reis estavam bloqueadas por uma ordem judicial expedida pela 10ª Vara Federal do Distrito Federal às 10h33 do dia 18 de agosto, em cumprimento a uma decisão do juiz Vallisney de Oliveira, responsável pela Operação Greenfield.
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De acordo com documentos do caso, obtidos por ÉPOCA, há suspeitas de que executivos da Odebrecht tenham pagado propina para que a Funcef, o fundo de pensão dos funcionários da Caixa, investisse R$ 300 milhões num projeto da empresa. Foi com base nisso que o Ministério Público Federal pediu ao juiz Vallisney um bloqueio de bens de R$ 141 milhões. Naquele dia de agosto, assim, Fernando Reis não conseguiu movimentar sua conta.
Trechos de decisão do juiz Vallisney de Oliveira que bloqueou R$ 141 milhões dos bens de cada um dos investigados (Foto: Reprodução )
Em vez de bater de frente como fez com a Lava Jato, a Odebrecht decidiu cooperar. Seus advogados correram ao Ministério Público Federal e sustentaram que não houve irregularidades da Odebrecht, mas concordaram em apresentar uma fiança de R$ 141 milhões para desfazer o sequestro de bens das pessoas físicas. O juiz Vallisney desbloqueou as contas.
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O caso remonta à primeira semana de outubro de 2013, quando a carga de trabalho foi intensa nos 11º, 12º e 13º andares da sede da Funcef, em Brasília. Era a reta final para decidir se R$ 300 milhões dos servidores da Caixa seriam investidos numa empresa do grupo Odebrecht. Os funcionários produziam um relatório por dia. Em 2 de outubro, a Gerência de Controles e Riscos alertou sobre uma avaliação equivocada. Sem esperar uma discussão no grupo técnico, no dia seguinte a Diretoria de Investimentos decidiu a favor do aporte. Em 8 de outubro, a Diretoria Executiva fechou o negócio. “Há grande probabilidade desse aporte de capital ter se originado de ilícitos que envolveram tratativas ilegais entre dirigentes da empresa e/ou representantes do poder público federal e/ou funcionários da Funcef”, afirma o Ministério Público. “[As irregularidades] podem configurar as condutas ilícitas de gestão fraudulenta, corrupção, lavagem de dinheiro e/ou tráfico de influência.”
Trechos de ata da reunião da Funcef que aprovou aporte na Odebrecht, mesmo com alerta de diretores sobre irregularidades (Foto: Reprodução )
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Junto com outros dois grandes fundos de empresas estatais, a Petros (de funcionários da Petrobras) e a Postalis (dos Correios), a Funcef é investigada na Operação Greenfield por operações suspeitas. Esses fundos são caixas bilionários, que investem recursos para, no futuro, pagar aposentadorias de servidores públicos. Assim como ocorria na Petrobras, dirigentes a serviço de PT e PMDB direcionavam investimentos para empresas que pagavam propina a políticos. Não à toa, Funcef, Petros, Postalis e Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, acumularam perdas superiores a R$ 110 bilhões nos últimos anos, atribuídas à corrupção.
Os investigadores não têm provas de pagamentos de propina, mas suspeitam do negócio da Funcef com a Odebrecht Ambiental pela semelhança com outros casos em que houve corrupção. A Funcef não deu ouvidos a uma empresa contratada, que considerou o negócio “não atrativo” . Preferiu a opinião da Voga, que deu aval ao negócio levando em conta apenas dados fornecidos pela própria Odebrecht. “Já existia, previamente a qualquer ato formal de análise da oportunidade de investimento, o ‘compromisso’, por parte dos dirigentes da Funcef, de realizar tais aportes em favor da Odebrecht”, afirma o Ministério Público. Segundo a investigação, a Funcef gastou R$ 300 milhões, mas, de acordo com cálculos da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), entidade que fiscaliza os fundos, a parte comprada valia no máximo R$ 202 milhões. Atualizado, o prejuízo de R$ 98 milhões corresponde aos R$ 141 milhões citados na ação. A Previc aponta que o então diretor-presidente da Funcef, Carlos Alberto Caser, e os diretores Maurício Marcellini e Carlos Augusto Borges foram responsáveis pelas irregularidades.
A Odebrecht afirma em nota que “o investimento realizado pela Funcef foi regular e não lhe trouxe prejuízo. Avaliações independentes feitas por auditoria de renome e o retorno efetivamente já obtido pela Funcef demonstram a valorização do investimento feito por ela”. O ex-diretor Maurício Marcellini disse que o valor do negócio estava correto e que um laudo independente calculou rentabilidade de 40% para a Funcef no primeiro ano. A defesa dos ex-diretores Caser e Carlos Borges disse que não poderia se pronunciar. A Voga disse que a investigação se refere à gestão anterior da empresa.