SÃO PAULO – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci exerceram influência decisiva para que a consolidação da indústria petroquímica brasileira fosse capitaneada pelo grupo Odebrecht, por meio da hoje gigante Braskem. Em diferentes movimentos do setor ao longo dos anos 2000, o governo petista agiu em favor dos interesses do grupo em troca de apoio financeiro, segundo o empresário Emílio Odebrecht e Alexandrino Alencar, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht.
Thank you for reading this post, don't forget to subscribe!O reconhecimento do papel dos petistas aparece em delação premiada acertada com a força-tarefa da Lava-Jato. Desde o exercício de influência em decisões estratégicas da Petrobras, que em determinados momentos ensaiou um retorno com força à indústria petroquímica, até a possível demissão de um diretor da estatal contrário aos interesses da Braskem foram colocados na conta de Lula e Palocci.
“Hoje compreendo que a nossa presteza e o nosso volume de pagamentos feitos a pretexto de contribuição para campanhas eleitorais, além de nossa relação de confiança estabelecida há mais de 12 anos à época, contribuíram para a continuidade da privatização do setor petroquímico e nas decisões que tanto o ex-presidente Lula quanto outros integrantes do quadro do PT tomaram durante sua gestão, que foram coincidentes com os nossos interesses e fundamentais para o crescimento e consolidação da Braskem”, escreveu Emílio, em novembro do ano passado, em documento revelado nesta quarta-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O empresário conta que a privatização do setor foi tema constante de conversas com o então presidente Lula e, antes mesmo de sua eleição em 2002, aproximou-se do petista com vistas a questioná-lo sobre sua opinião em relação à indústria — o planejamento estratégico da Odebrecht previa uma mudança gradativa da Petrobras nesse setor, de principal fornecedora de matérias-primas para o posto também de acionista minoritária, e jamais concorrente.
Meses depois da primeira reunião sobre o assunto, que ocorreu em 2001 em São Paulo, segundo relato do empresário, Lula teria pedido a Emílio Odebrecht apoio financeiro para a campanha presidencial e teria dito que o assunto seria encaminhado por Palocci. Pelo grupo, o indicado foi Pedro Novis, que tempos depois assumiu a presidência do conselho de administração da Braskem.
Alexandrino Alencar conta que participou de um dos encontros entre Lula e Emílio no apartamento de Novis no Parque Villa Lobos, na capital paulista. Na ocasião, os executivos do grupo teriam deixado claro que o “apoio financeiro expressivo” à campanha do petista estava condicionado ao compromisso de que o setor passaria ao controle da iniciativa privada, caso vencesse a eleição.
Apesar do compromisso assumido pelo ex-presidente, a Petrobras levou adiante algumas tentativas de fortalecer seu papel na petroquímica. Diante disso, em junho de 2003, Lula e Emílio tiveram outra reunião, da qual participaram Palocci e a então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff. No encontro, ficou acertado que “as posições que viessem a ser adotadas pela Petrobras sobre o setor petroquímico seriam tratadas como assunto de governo”.
Além disso, o ex-presidente teria assegurado que a Braskem “sempre seria ouvida” antes da tomada de qualquer decisão que pudesse afetar seus interesses. Exemplo disso, segundo Emílio, foi a movimentação de Lula em 2005 para evitar que a Petrobras comprasse a participação da Petroquímica Ipiranga na Copesul, central de matérias-primas do Polo de Triunfo (RS), ou a própria Ipiranga. Como resultado, em 2007, a Braskem acabou por comprar os ativos petroquímicos do grupo Ipiranga.
Alencar tem uma versão mais detalhada para o episódio. Segundo ele, a Braskem incluiu nos temas tratados com Palocci e Lula a possibilidade de a Petrobras comprar a Ipiranga em parceria com a companhia e com o grupo Ultra, o que de fato ocorreu. O ex-executivo da Odebrecht relaciona um pagamento de US$ 650 mil a Palocci em 2006 a esse evento.
Ainda em 2003, Alencar e o então presidente da Braskem, José Carlos Grubisich, participaram de reunião no Palácio da Alvorada com o então chefe de Gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, Lula, Palocci e José Eduardo Dutra, presidente da Petrobras, e falaram sobre as dificuldades que estavam enfrentando para assinar um contrato de longo prazo de fornecimento de nafta, principal matéria-prima da Braskem. Segundo um dos executivos da Odebrecht, o então diretor de Abastecimento da estatal, Rogério Manso, era contrário ao acordo. Palocci comprometeu-se a “tomar providências” e Alencar, na mesma época, aproximou-se do deputado José Janene (PP). Em 2004, Janene informou que Manso havia sido demitido.
Mas a Petrobras ainda insistia no protagonismo. Em 2007, fechou a aquisição da Suzano Petroquímica por quase R$ 4 bilhões, considerando-se também a dívida da companhia, o que levou Emílio Odebrecht a manifestar sua indignação ao governo. A pressão, somada à do grupo Unipar, freou os planos da estatal de voltar a ser controladora na indústria: pouco depois, a estatal se uniu à Unipar na Quattor, que em 2010 foi vendida à Braskem.
(Stella Fontes | Valor)
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