Resolução de comissão interministerial obriga empresas estatais a promover auditoria interna periódica em seus fundos de pensão
Com o objetivo de aprimorar a governança dos fundos de pensão, uma comissão interministerial passou a determinar a obrigatoriedade de auditorias internas por iniciativa de empresas estatais em seus fundos de pensão. A regra foi publicas na Resolução 9 da CGPAR (Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União) e obriga as empresas estatais no âmbito federal a promoverem uma auditoria interna semestral nas entidades fechadas.
“O próprio desencadeamento de uma CPI e a identificação de determinados fundos em que ocorreram fragilidades no processo de controles e desvio de conduta são exceções ao sistema. Mas não é possível negar que ocorreram”, afirma Luís Ricardo Martins, diretor jurídico da Abrapp. Ele lembra que a Lei Complementar 108, de 2001, já dispunha sobre a obrigação das estatais de fiscalizar as atividades de suas entidades, mas não de maneira detalhada, citando nominalmente quais pontos precisam ser auditados, como ocorre na Resolução da CGPAR.
Martins ressalta que o arcabouço jurídico existente hoje “já é muito moderno”, e cita como exemplos a resolução 13 do Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC), que trata dos princípios, regras e práticas de governança a serem observados pelas entidades, e a supervisão e gestão baseada em risco que vem sendo implementada no sistema nos últimos anos. “O ambiente interno dos fundos de pensão tem mecanismos que garantem uma governança corporativa evoluída, com a devida segurança aos envolvidos”, pondera. O representante explica que existem pontos fora da curva, que desviam da blindagem feita através dos normativos, mas é necessário enxergar esses casos como algo que foi pensado e estruturado por pessoas que tinham a intenção de burlar os mecanismos de proteção.
Apesar de já existir outros mecanismos de controle, Martins acredita que a nova exigência é positiva. “Existem dois requisitos básicos para que um fundo de pensão dê certo, que são transparência e credibilidade. Esse meio de acompanhamento com a fiscalização, para que a patrocinadora tenha maior interesse pelo ambiente do fundo de pensão, só vem ajudar na evolução do sistema”, diz.
Rigor – Embora algumas entidades já adotem o procedimento de auditoria interna, poucas atendiam todos os pontos que foram estabelecidos pela resolução da CGPAR, nota Frederico Vieira, supervisor atuarial da Gama. “Existem as entidades que já fazem o acompanhamento, mas o escopo que foi definido agora é amplo, e se tem alguma que seguia algo próximo a isso são raríssimas”, fala o especialista.
De acordo com a interpretação do normativo, que carece ainda de alguns esclarecimentos sobre detalhes técnicos, a auditoria pode ser feita anualmente, executada junto com os demais procedimentos, como avaliação atuarial, concessão de benefícios e custeio dos planos, que também são feitos uma vez por ano e que até podem estar inclusos no trabalho de auditoria, explica Vieira. No entanto, o acompanhamento e a produção de relatórios devem ser feitos semestralmente pelo previsto na norma.
Como se trata de um trabalho que ainda vai ser desenvolvido, o supervisor da Gama imagina que a proposta da resolução é que a fundação faça uma auditoria anual que aponte a necessidade de um eventual plano de ação para corrigir possíveis defasagens, e no meio do ano esse plano já constituído seja acompanhado e revisto se necessário.
Em termos de custos, Vieira entende que a auditoria que passa a ser obrigatória não deve onerar de maneira relevante as despesas das estatais e de seus fundos de pensão. “As entidades devem aproveitar as estruturas já existentes nas auditorias próprias das patrocinadoras. O custo que houver deve ser com a terceirização de trabalhos específicos. Ainda assim, uma auditoria de avaliação atuarial ou de cálculo de concessão de benefícios não são caras, porque as consultorias já tem esses produtos pré-formatados em prateleira”.
Proximidade – Como a resolução define que é de responsabilidade do conselho de administração da estatal federal o processo de auditoria interna de seu fundo de pensão, a tendência é que aumente a relação e conexão entre patrocinador e patrocinada, prevê o dirigente da Abrapp. “Às vezes a patrocinadora está muito distante do fundo de pensão, até por ela ter seu negócio principal, com uma atividade específica. Essa distância existe em alguns casos, e exigiu um normativo como essa resolução, que implica em um acompanhamento mais rigoroso e mais próximo”, diz Luís Ricardo Martins.
Além da questão dos desvios de conduta, a própria conjuntura do atual ambiente macroeconômico também tem levado algumas fundações a um desequilíbrio, e a um plano de equacionamento de déficit que vai exigir um esforço maior tanto da patrocinadora como dos participantes, nota o diretor da Abrapp. “A resolução vem trazer o patrocinador para fiscalizar sua entidade mais de perto”, afirma o presidente da OABPrev-SP.
Martins estima ainda que a Resolução, ao solicitar uma série de pontos a serem auditados pela estatal, que, por sua vez, não está familiarizada com assuntos de natureza previdenciária, por não ser esse seu ‘core business’, terá de contratar serviços de terceiros para realizar o trabalho de maneira efetiva. “O sistema de previdência complementar tem apostado muito no processo de capacitação e profissionalização de seus quadros. Nosso sistema não é simples, e tem várias peculiaridades e temas, seja na parte de investimento, atuarial, jurídica ou contábil”.
Dentro dessa maior profissionalização buscada pela indústria, Martins entende que a Previc também precisa avançar mais do que já fez nos últimos anos. “A Previc evoluiu muito, tem técnicos bem preparados para examinar os fundos de pensão, mas é preciso mais”. O diretor da Abrapp defende que a Previc tenha total autonomia financeira e administrativa, e seja um órgão de Estado efetivamente, com diretores com mandato autônomo, para não ficar à mercê de mudanças no governo para que se altere o diretor da Previc. “É preciso que a Previc se torne uma autarquia, com toda autonomia necessária que precisamos para que fortaleça a fiscalização”.
Dupla fiscalização – O projeto de lei 268 (PLP) que é discutido na Câmara dos Deputados, tem gerado polêmica na questão da fiscalização. É que o projeto original aprovado no Senado prevê a fiscalização dos fundos pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A proposta não foi bem recebida pela Abrapp. “A partir do momento em que vemos o Tribunal de Contas da União (TCU) tentando fiscalizar os fundos de pensão, acho que há uma superposição de poderes. O Estado brasileiro está gastando com dois órgãos um dinheiro a mais para fazerem a mesma fiscalização”, diz o diretor da Abrapp.
Além do gasto adicional, ele nota também que as fundações tem uma complexidade própria, que é estranha aos técnicos do TCU. “Cabe ao TCU fiscalizar a patrocinadora. A partir do momento em que o dinheiro sai da estatal e entra no fundo de pensão, a competência para a fiscalização passa a ser da Previc”, afirma. “Essa limitação de atuação tem de estar devidamente estabelecida para que não haja superposição dos órgãos de atuação, e um gasto maior e indevido para a sociedade”.
Exigências da auditoria interna
• política de investimentos e sua gestão;
• processos de concessão de benefícios;
• metodologia utilizada no cálculo atuarial, custeio, consistência do cadastro e aderência das hipóteses;
• procedimentos e controles vinculados à gestão administrativa e financeira da entidade;
• despesas administrativas;
• estrutura de governança e de controles internos da entidade;
• recolhimento das contribuições dos patrocinadores e participantes em relação ao previsto no plano de custeio.
Fonte: CGPAR
Baixe a íntegra da Resolução 9 da CGPAR: