Nova presidente do BNDES quer usar banco para acelerar privatizações

A nova presidente do BNDES, Maria Sílvia Bastos Marques, evidenciou, em seu discurso na transferência de cargo, no Rio, nesta quarta-feira, o maior protagonismo que o banco terá na agenda de privatizações e concessões, que deverá ganhar corpo no governo de Michel Temer como instrumento de ajuste das contas públicas. A intenção foi confirmada logo em seguida, pelo discurso do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

Além de referendar os planos, por parte do governo, de acelerar a venda de ativos e as concessões de projetos de infraestrutura, na tentativa de resolver a grave crise fiscal do país, Meirelles e Maria Sílvia deixaram claro o esforço que farão para mudar significativa o papel do banco na indução do desenvolvimento.

Com esta nova orientação, o banco caminha para um modelo de atuação que ganhou relevância nos governos de Fernando Collor, Itamar Franco e de Fernando Henrique Cardoso, quando, além de financiamento às empresas, dedicava-se a identificar ativos estatais para venda e concessão e a planejar tais processos.

A nova presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques (Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)A nova presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques (Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)

Nos últimos 14 anos, o Banco foi o braço executor da política econômica do governo petista, com ênfase à maior participação do estado na economia, que se traduziu em volumes recordes de empréstimos subsidiados ao setor privado, financiamento à formação de “campeões nacionais” por meio de fusões e empréstimos a governos da América Latina para a realização de obras com empreiteiras brasileiras — em especial, a Odebrecht e a Andrade Gutierrez. Algumas dessas operações atualmente estão sob escrutínio por investigações realizadas pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, e em particular, da Operação Lava Jato.

Maria Sílvia e Meirelles indicaram, ainda, a intenção de buscar deslocar o eixo principal de atuação, de financiamento a grandes empresas, em direção a projetos de infraestrutura.

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A nova presidente do BNDES disse que o banco deverá “aumentar significativamente sua atuação” na área “de desmobilização de ativos, como os de concessões, parcerias público-privadas e privatizações”. “O foco nesses processos, neste momento de severa restrição fiscal, em todos os níveis de governo, possui dupla importância: impactar diretamente a qualidade de vida de população, com a prestação de serviços de melhor qualidade em saneamento, mobilidade, rodovias e energia e alavancar recursos para que a administração pública possa recuperar sua capacidade de gestão e investimentos”, disse.

Meirelles também enfatizou a intenção de usar a capacidade técnica do banco no assunto para acelerar a venda de ativos. “Notem bem que, além de concessões, falo em privatizações”.

Em entrevista coletiva minutos depois, Maria Sílvia explicou que o formato do modelo de vendas e concessões, assim como o banco passará a atuar nesses processos, ainda está sendo discutido pelo governo. Por este motivo, não disse se já havia ativos identificados, mas afirmou ver oportunidades na área de saneamento. “O país ainda tem muitas necessidades nesta área”. Disse, ainda, que pretende aumentar os financiamentos a projetos de energias renováveis e a incentivar a substituição do papel do BNDES de grande financiador de empresas pelo mercado de capitais.

Maria Sílvia afirmou não ter como prever qual será o volume de empréstimos concedidos este ano, devido à crise e ao fato de ainda estar se inteirando dos números do banco. No ano passado, a liberação de financiamentos a empresas caiu 28% e, no primeiro trimestre deste ano, 46%. Disse também que, por enquanto, não há previsão de o BNDES participar de alguma operação para ajudar a Petrobras a reduzir seu endividamento.

Em seu discurdo de despedida, o economista Luciano Coutinho agradeceu “ao presidente Lula e à presidenta Dilma pela confiança e pelo longo mandato” à frente do banco. Coutinho assumiu o cargo em 2007. Ressaltou que todas as decisões do banco são “impessoais, técnicas e colegiadas”.

Coutinho disse, ainda, que, nos últimos anos, o BNDES tornou-se “a mais transparente instituição financeira brasileira e mesmo quando comparada a seus pares internacionais”. Os detalhes sobre financiamentos relativos a prazos, taxas e beneficiados, só se tornou pública por determinação judicial, em 2014. A decisão, da Justiça Federal, acolheu pedido do Ministério Público Federal, que entrou com ação pedindo divulgação dos dados depois de o banco se negar a fazê-lo alegando necessidade de preservação de sigilo bancário.

Por fim, o economista disse à sucessora que “a casa está sendo entregue em boa ordem”, com inadimplência de 0,23%, “a mais baixa do sistema financeiro”, e índice de capitalização elevado.

http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2016/06/nova-presidente-do-bndes-quer-usar-banco-para-acelerar-privatizacoes.html