A decisão sobre a eventual condenação da Petrobras no processo movido coletivamente por investidores nos Estados Unidos será jurídica. Mas a estatística e os métodos quantitativos foram cruciais para a aceitação do caso pelo juiz americano Jed Rakoff no início desta semana, no primeiro grande revés da companhia no processo, e terão papel ainda mais relevante para definir o tamanho da possível indenização que a estatal terá que pagar, se for condenada.
Analistas e investidores vem se questionando sobre quanto a Petrobras poderá ser obrigada a desembolsar caso condenada ou caso busque um acordo, especialmente pelo efeito que uma saída de caixa de valor desconhecido, mas provavelmente elevado, poderá ter sobre a situação financeira da companhia, que não é boa.
O cálculo vai depender de uma modelo estatístico ainda indefinido, mas que será complexo o suficiente para gerar discussão tanto no tribunal como no mercado.
Ao decidir sobre o argumento da acusação de que os investidores que compraram recibos de ações e títulos de dívida da estatal atendem o conceito legal de “classe” e que potencialmente foram prejudicados por informações supostamente enganosas prestadas pela companhia, o juiz gastou duas dezenas de páginas arbitrando sobre pontos a favor e contra a existência de um mercado eficiente para os papéis da Petrobras nos EUA.
A lógica é que os investidores só podem ter sido prejudicados por informações falsas se de fato as cotações reagem a divulgações, reais ou enganosas, feitas sobre ela.
A partir de oito itens que indicariam eficiência de mercado do ponto de vista da jurisprudência da Justiça americana (conhecidos como “fatores Cammer”), Rakoff acatou sete deles sem delongas.
A Petrobras é enorme, tem percentual relevante das ações em circulação, é acompanhada por mais de 50 analistas e pela imprensa, o giro semanal dos papéis é elevado, a diferença média entre a ofertas de compra e venda de seus ADRs é bastante reduzida e ela tem como acionistas grandes investidores institucionais.
Foi um único “fator Cammer” que concentrou as discussões, que é o que trata da evidência empírica de que as ações respondem numa relação de causa e efeito a dados financeiros e a anúncios e eventos não previstos.
Assessorada pelo professor Steven Feinstein, da Babson College, a acusação selecionou dias de balanços e de comunicados em que a Petrobras citou a palavra corrupção para atestar que as ações se moveram com intensidade distinta daquela observada em dias comuns. E usou um teste de médias para evidenciar a diferença estatística.
A defesa, com auxílio do professor Paul Gompers, da Harvard Business School, sustentou que o método não foi tirado de periódico com revisão por pares, apontou problemas na seleção de dias e, principalmente, que o teste não verificou se as ações reagiam para a “direção” prevista – ou seja, se notícias teoricamente negativas provocavam baixa das ações e vice-versa.
O juiz, que não é especialista, mostrou desenvoltura no assunto. Apesar de reconhecer a dificuldade de provar causalidade – “mesmo na física ou química, que dirá em análise de mercado”, escreveu -, ele citou recente argumento da Suprema Corte americana, de que a eficiência de mercado não é algo binário, para justificar que a evidência apresentada foi suficiente para esse estágio do processo. “Quando os fatores indiretos descrevem de forma esmagadora um mercado grande e que funciona bem para os valores mobiliários da Petrobras, o bom senso sugere que o mercado reagiria a divulgações de informações relevantes”, disse.
Mais difícil, contudo, será calcular o dano aos investidores. Será preciso tentar isolar o efeito da corrupção de inúmeros fatores que afetam as ações, como petróleo, câmbio e eventos políticos, pelo fato de a Petrobras ser estatal.
A acusação propôs um método, que o juiz considerou possível, por já ter sido usado, mas que ainda não acatou. Primeiro, um estudo de evento verifica quanto as ações caíram conforme as informações foram divulgadas. A partir disso, cria-se uma linha teórica apontando qual seria a cotação dos papéis sem o efeito das informações alegadamente enganosas ao longo do tempo. Por fim, o dano equivale à diferença entre o preço efetivo e o “desinflacionado” na data da compra e da venda dos papéis.
Outro método, segundo o professor José Elias de Almeida, da Universidade Federal do Espírito Santo, seria a partir da avaliação por múltiplos. “Se o lucro por ação divulgado está errado, isso levaria a premissas erradas nos modelos de avaliação e parte do dano poderia ser identificada aí”, disse, destacando a importância da contratação de experts, já que toda subjetividade precisa ser justificada e fundamentada.
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