Bolsa: enquanto estrangeiro entra, fundo de pensão sai

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Com ações e câmbio baratos, caça de pechinchas deve ter política como gatilho

SÃO PAULO – Responsáveis por 80% do fluxo de recursos para a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), o humor dos investidores estrangeiros e dos fundos de pensão é um importante indicador de performance das ações brasileiras. E em 2015 esses dois atores tiveram sinais contrários: enquanto o estrangeiro colocou dinheiro em ações, os institucionais tiraram.

Para 2016, com o valor das ações e do real perto das mínimas desde a última grande crise global, os estrangeiros devem continuar com um fluxo positivo para o país. A intensidade e o “timming” desse movimento vai depender, para variar, dos sinais que vierem de Brasília.

“Dependendo do preço, ainda que o cenário político ainda seja incerto, a bolsa brasileira fica atrativa para os estrangeiros”, avalia Jorge Marino Ricca, gerente executivo de fundos de ações da BB DTVM, maior gestora de recursos do país.

Já os fundos de pensão devem continuar mais distantes da bolsa uma vez que têm à sua disposição títulos públicos pagando retornos polpudos. “Em cenários de estresse e instabilidade política e econômica como o que estamos vivendo agora, a grande parte das fundações tende a alocar em títulos públicos do governo indexados à inflação, cujos retornos superam as suas metas atuariais [de rentatibilidade]”, diz Guilherme Velloso, diretor responsável pela área de investimentos da Abrapp, associação que reúne os fundos de pensão.

Os investidores institucionais sacaram de forma líquida R$ 23,5 bilhões da bolsa no ano passado. Segundo Velloso, investidores de longo prazo como fundos de pensão não podem descartar a aplicação em ações, mas que a aplicação em bolsa em 2016 deve ser mais pontual, procurando boas ações que estão baratas.

Dinheiro gringo

Os estrangeiros fecharam 2015 com um saldo positivo (entradas menos saídas) de R$ 16,4 bilhões, segundo dados da BM&FBovespa. O movimento de entrada se concentrou no primeiro semestre do ano, quando o investidor gringo aportou R$ 21 bilhões na bolsa brasileira.

Mas na segunda metade do ano, quando a situação política e econômica mostrou maior deterioração e sepultou as projeções otimistas do começo do ano, as saídas mensais começaram a acontecer. Os meses de maiores saques foram em agosto (- R$ 3,3 bilhões) e dezembro (- R$ 4,3 bilhões). Confira a tabela abaixo.

“Dezembro é o mês em que os estrangeiros fazem realocações para o ano seguinte e, como o ano terminou ruim no Brasil, parte dos recursos saíram para serem alocados em outros emergentes”, diz Ricca.

Dezembro foi o mês em que o Brasil perdeu o grau de investimento pela Fitch Ratings, passando a ser avaliado como “junk” por duas agências – a S&P já havia tirado o selo de bom pagador do país em setembro. Alguns investidores estrangeiros, como fundos de pensão, só têm permissão para aplicar em ativos de países com grau de investimento.

O gerente da BB DTVM pondera que não se pode afirmar que a saída de dezembro indica uma tendência para 2016. “É importante frisar que em 2015 a entrada ainda foi representativa, de R$ 16 bilhões. Dezembro saiu recursos, mas em novembro e outubro as entradas haviam sido boas. Ainda é cedo para dizer que dezembro foi um movimento atípico ou se será uma tendência.”

O estrangeiro ainda tem a questão do câmbio. Se o Ibovespa caiu 13% em reais, em dólar o tombo foi ainda maior, de cerca de 40%, dado que o dólar se valorizou quase 50% frente ao real em 2015. Nesse contexto, tirar dinheiro da bolsa neste momento representaria uma realização de perdas muito grande. O gringo que colocou dinheiro em ações brasileiras no começo do ano, quando o dólar estava próximo de R$ 3, por exemplo, perderia com a moeda norte-americana ultrapassando os R$ 4. “Entrando agora com o câmbio mais desvalorizado, o colchão de amortecimento seria maior”, diz Ricca.

Desempenho da bolsa

A média das projeções de analistas da bolsa aponta para um Ibovespa em 54 mil pontos ao fim de 2016. Isso equivaleria a uma alta próxima de 25% em relação ao fechamento de 2015.

Os analistas do Citi ponderam que para os 54 mil pontos se concretizar é preciso que o país consiga implementar “algum aperto fiscal” para diminuir o risco dos investimentos no Brasil. Para o banco norte-americano, como o Ibovespa e o real estão próximos da mínima atingida após a crise financeira global, os investidores devem considerar reconstruir as suas posições em ações cíclicas no Brasil.

A Planner é mais conservadora e projeta um Ibovespa em 48.630 pontos ao fim deste ano, equivalente a uma valorização de 12,2%. “Acreditamos que o primeiro trimestre de 2016 deverá definir os caminhos que a economia brasileira irá trilhar durante o ano, mas quaisquer que sejam, não serão nada fáceis. Desta forma, a nossa projeção para o Ibovespa em 2016 não tem como não embutir uma boa dose de pessimismo para os investimentos em renda varável”, avalia a equipe de análise da corretora.

Ricca, da BB DTVM, observa que uma diferença deste ano para o ano anterior é que as projeções já começaram o ano bastante ruins, parecendo estar mais próximas do que deve acontecer se comparado com as expectativas no início de 2015.

“O cenário macro e o valuation das empresas parecem ser muito mais realistas. Sendo assim, qualquer surpresa positiva pode ser um impulsionador para o mercado”, avalia, citando um possível avanço no Congresso da agenda de reformas.

Participação mensal (em R$ mil)
Mês  Institucional   Estrangeiro 
Janeiro -3.526.487 1.575.388
Fevereiro -4.338.071 4.481.071
Março -3.473.053 3.809.412
Abril -5.910.072 7.604.948
Maio -1.689.789 1.472.826
Junho -2.896.614 2.596.655
Julho 512.238 -567.860
Agosto 1.274.137 -3.314.590
Setembro -1.293.065 -418.532
Outubro -2.368.558 2.545.923
Novembro -2.000.398 912.017
Dezembro 2.261.182 -4.310.179
2015 -23.448.541 16.387.079
Fonte: Um Investimentos